3 de julho de 2011

O Brasil visto por Hollywood

Tradicionalmente, as relações entre o Brasil e Hollywood não ficam bem na fita. Os projetos de filmes com locações aqui muitas vezes falharam. Em 1942, Orson Welles veio filmar seu ambicioso documentário “It’s All True”, que deu em nada.

As filmagens de “The Americano” (1955), no Mato Grosso, tiveram de ser suspensas por falta de dinheiro. A equipe foi repatriada e concluiu por lá mesmo o filme, até hoje inédito no Brasil, felizmente.

Em 1956, o diretor Samuel Fuller visitou o Mato Grosso em busca de locações para o filme “Tigrero”, cujo elenco seria encabeçado por John Wayne. A produção não se viabilizou devido ao alto custo de um seguro de vida para o ator.

Mais recentemente, filmaram aqui enredos situados em fictas republiquetas sul-americanas. É o caso de “Luar sobre Parador” (Moon Over Parador, 1988), de Paul Mazursky, e “Os Mercenários” (The Expendables, 2010), de Sylvester Stallone. Mas para enredo situado aqui, filmagem no México; caso de “Amazônia em Chamas” (The Burning Season, 1994), telefilme sobre Chico Mendes.

Hoje, parece que a situação está mudando. O Rio de Janeiro acaba de fornecer o cenário para “Velozes e Furiosos 5 – Operação Rio” (Fast Five, 2011) e o desenho animado “Rio” (Idem, 2011), dirigido pelo carioca Carlos Saldanha e que é sucesso em todo o mundo.

Nos filmes de Hollywood, a imagem do Brasil tem sido a de esconderijo de criminosos. Por exemplo, em “Acorrentados” (The Defiant Ones, 1958), Tony Curtis e Sidney Poitier são dois prisioneiros que fogem acorrentados um ao outro. Numa cena em que Curtis tenta partir a corrente com uma pedra, ele fala de suas aspirações e conclui: “Irei para o Rio e nunca serei encontrado. Nunca serei encontrado”.

No clássico “Bonequinha de Luxo” (Breakfast at Tiffany's, 1961) acontece algo ainda mais curioso. Em Nova York, o brasileiro José da Silva Pereira, com o cabelo empastado ao estilo “latin lover”, vai a uma festa no apartamento da garota de programa Holly Golightly, cujos convidados não são o que aparentam.

Interpretado pelo espanhol José Luis de Villalonga, José é um tipo desconfiado, sempre pronto para escapar. Ao ver Paul Varjak atender ao telefone, ele logo quer saber do que se trata: é o vizinho que reclama do barulho e ameaça chamar a polícia. Só de ouvir a palavra “polícia” José já quer cair fora. E, assim que a polícia chega, ele e Varjak vazam pela escada de incêndio.

Embora só apareça em duas cenas, José tem participação importante na trama, porque Holly, à caça de um marido rico, topa vir para o Brasil com ele. Numa das cenas, José e Holly portam cada qual uma bandarilha, aquele espeto que se usa nas touradas.

Disposta a casar com um brasileiro, Holly resolve aprender português. Numa visita, Varjak a encontra ouvindo uma aula gravada e pergunta que língua é aquela. Ela diz que é o português, “uma língua muito complicada, que tem quatro mil verbos irregulares”. A voz da gravação tem o inconfundível sotaque de... Portugal.

Por Holly se envolver em escândalo que vai parar nas manchetes, José decide terminar o romance por meio de um telegrama. Após ler a mensagem de José, Varjak diz a Holly que nunca acreditou que ela “tivesse inclinação para ser a rainha dos pampas”.

Como se vê, o filme faz uma confusão dos diabos com a imagem do Brasil, enfiando no mesmo balaio Espanha, México, Portugal, Argentina. E mais. Pode-se intuir que Holly está tão desesperada por um marido rico que aceita casar até com um pilantra brasileiro. E se José vive correndo da polícia, sua alegação no telegrama de que está agindo em defesa do seu nome e da sua família soa como pura ironia – potencializada pela fala de Holly de que será a mulher do futuro presidente do Brasil.

Na comédia “Primavera para Hitler” (The Producers, 1968) há outro exemplo. Um produtor da Broadway está na pindaíba porque há tempos não consegue emplacar um sucesso. Seu guarda-livros sugere-lhe tomar emprestado um milhão de dólares e aplicar só 60 mil na montagem de uma peça, para embolsar a diferença. O produtor agarra-se com ele e, eufórico, se põe a dançar e a tagarelar sobre o golpe. Por fim, diz: “Com nosso milhão, nós voamos para o Rio de Janeiro”. Até quando vamos dar motivos para Hollywood queimar o nosso filme!

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